terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Mitologia Tecnológica


A história da humanidade e das civilizações se confunde com a história das religiões. Mitos e crenças reformulados e recriados em cada período histórico. Basicamente procurando entender e explicar a origem do universo. De onde viemos, o que fazemos aqui e pra onde vamos. E sobretudo, uma reconexão com o cosmos e a alma universal onipresente. Do mesmo modo que as ciências e a tecnologia vem tentando fazer há um bom tempo.

Muito além das questões que movem ciência e religião, porém imersas no conceito do 'religare', a ambição da tecnologia busca algo mais. Algo além de respostas e explicações. Busca a comunhão total do homem com o conhecimento e toda forma viva que pode administrá-lo.

Qual o sentido da vida ? Há vida em outros planetas ? Há vida além da vida ? Estas são algumas questões que movem as religiões e filosofias há milênios. A grande maioria delas acredita ou pressupõe que há algo maior que o homem. Seja em corpo físico, psicológico, astral ou espiritual. E buscam ligar de certa forma o homem à 'consciência universal', seja ela entendida como filosofia, ciência e conhecimento; Ou algo divino e sobrenatural. 

Do mesmo modo a tecnologia tem buscado aproximar e conectar os homens entre si e com o conhecimento. Assim como as crenças ancestrais colocam o homem como um ser mediador das manifestações divinas, a ciência coloca a tecnologia como um meio além do meio. Fazendo a ligação entre os homens, a informação e o universo.

Conforme coloca Rudiger (2006) em 'Comunicação, cultura e mediações tecnológicas': "A tecnologia sem dúvida realiza façanhas, mas também se tornou matriz de um imaginário que funciona no sentido de nos fornecer um poderio ilimitado e de nos conduzir a uma unificação maquinística que antes a religião oferecia em termos cósmico". Neste sentido podemos observar o crescimento das conexões interpessoais a partir do advento dos meios eletrônicos de comunicação. Relações estas, que apesar de mediadas, crescem assustadoramente em volume.

O que antes as ciências biológicas e as filosofias espirituais tratavam como sentidos humanos, como por exemplo o 'ver', o 'sentir', o 'ouvir' e o 'falar', agora se mostram dimensionados pelas extensões tecnológicas. A fala, a audição e a visão são cada vez mais presentes nas interações homem máquina, assim como nas interações interpessoais mediadas pela tecnologia.

As divindades extra-sensoriais da percepção agora aparecem imersas na interação multimídia. Textos, imagens, áudio e vídeos, compartilhados entre homens a partir de máquinas, se convertem como as materializações divinas atuais. A materialização digital do conhecimento. 

O homem cada vez mais conectado com o mundo. Buscando conexões extra mundo. Conexões universais. Comungando informações e ideologias a partir de compartilhamentos em massa. O acesso à informação e a comunicação se tornaram a religião dos dias atuais. Onde, cada vez mais, conhecimento é poder. E conexão é onipresença.

Os deuses tecnológicos e seus poderes multimídia convergem ao consumo dos homens a partir da interação mediada. Homens estes que sonham em tornar-se deuses. Criando seres eletrônicos à própria imagem e semelhança. Como uma forma de perpetuar o que hoje conhecemos como a alma cósmica do homem. Acreditando no que muitos chamam de: 'A construção da essência pelo conhecimento'.

Tudo isso foi fortalecido pelo avanço tecnológico eletrônico. Conforme coloca Canclini (2006): "A produção e circulação de cultura audiovisual nos meios de comunicação industriais se tornaram a principal forma de intercâmbio, visibilidade e conhecimento recíproco entre as sociedades". Ao certo vivemos a formatação do corpo social, da inteligência artificial e do conhecimento coletivo.

Impossível fazer previsões. Pois não há precedentes, na história das civilizações, de tamanha conexão, interação e compartilhamento de informações. O certo é que esta é uma viagem sem volta. Cada vez mais estaremos mais e mais conectados. Interagindo e compartilhando o conhecimento universal em um contexto de inteligência coletiva.

Na era do 'religare eletrônico' o homem cede aos poucos a sua posição de 'meio' às máquinas. O 'médium tecnológico' em breve se tornará parte de um hibrido entre homem e máquina. O que muitos propõem como a evolução da espécie humana. Um novo meio à manifestação dos deuses. Compartilhando de forma onipresente a alma imortal do conhecimento universal. Em poucas palavras podemos dizer que a mitologia se vê cada vez mais imersa na tecnologia.

J.P.D.

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